terça-feira, 20 de julho de 2010

Depois do almoço, papai deitou-se no sofá e cochilou. Chamei você para meu quarto, queria falar com você. Mamãe e Bia ficaram na cozinha cuidando da louça. Fechei a porta, não queria ser interrompida. Você brincou:
- O que você vai fazer comigo? Seus pais estão lá fora, hein!
- Eu quero falar com você. Lembra que eu disse que, quando eu tomasse uma decisão, você seria o primeiro a ficar sabendo? Pois, então. Eu tomei uma decisão. Eu sei que não vai agradar algumas pessoas, mas se eu não a tomasse, seria como se tivesse me auto flagelando.
- O que foi, querida? Que decisão é essa que tomou? O que tanto a afligia?
- Minha profissão, Gustavo. Vou abandonar o Direito. Não me sinto à vontade para exercer a profissão. Eu achei que poderia, mas cada vez que tenho que desempenhar a função, me sinto sufocada, tolhida, infeliz. Não me sinto realizada.
- E o que você pretende fazer?
- Ainda não tenho muita certeza. O Carlos, você lembra dele, o jornalista, me convidou para fazer um teste para trabalhar na redação da emissora em que ele trabalha, mas não aceitei. Eu disse a ele que essa loucura de trabalhar com jornalismo, também não tem a minha cara. Ele ficou de me ajudar a encontrar alguma coisa que eu possa fazer.
- E você já pretende deixar o escritório do Arnaldo?
- Ainda não. Não vou deixá-los assim. Também, tenho de amadurecer o que vou fazer. Enquanto isso, continuo com eles. Eu não sei, mas acho melhor, também, ainda não contar para minha família.
- Também acho melhor, Camila. Até você decidir o que vai fazer, além de ser minha esposa e mãe dos nossos filhos, você não deve contar a eles sua decisão. Não comente nada nem no escritório. De repente, você pode repensar e voltar atrás. Por enquanto, não conte a ninguém. O que você decidir fazer, que deixe você feliz e realizada, vai me deixar feliz também. Eu darei o meu apoio. Só espero que não escolha algo que me deixe sozinho e abandonado por muito tempo, como ser aeromoça ou trabalhar em cruzeiros internacionais.
- Imagine que eu iria deixar você por tanto tempo! De jeito nenhum, amor. É mais fácil eu decidir ser sua secretária, para ficar na sua sombra, que largar você solto por aí.
- Eu iria adorar ter você como minha secretária. Iria chamar você toda hora, pedir para você sentar no meu colo e anotar alguma coisa na minha agenda, ou qualquer coisa assim, só para beijar seu pescoço e acariciar suas coxas.
- Isso é assédio. Você pode ser denunciado e responder por isso.
- Olha aí, lá vem a advogada. Quer largar a profissão, mas parece que já incorporou muita doutrina, doutora Camila.
- Não tem como fugir, querido. Muito do aprendizado vai me acompanhar a vida toda. Eu vou deixar de exercer, mas não vou deixar de ser.
- Vem cá. Não se preocupe. Você vai se sair bem no que escolher e eu estarei com você.
- Guto, agradeço por não me recriminar e me achar imatura por tomar uma decisão assim, a essa altura do campeonato. Seu apoio é muito importante para mim.
- Não é imaturidade, amor. As pessoas mudam. Tem gente que muda de profissão depois de dez, vinte anos exercendo uma, que não gostava, por outra, que lhe traz mais alegria. Agora, vem cá, quero um beijo, estou com saudades da sua boca.
Deitamos na minha cama e ficamos abraçados, em silêncio, durante algum tempo. Você adormeceu. Levantei bem devagar, fechei a cortina e cobri você com uma manta. Fui para a cozinha com mamãe e Bia.

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