A semana começou tranquila, sem grandes novidades, sem tumulto e nenhum acontecimento peculiar. Os comentários de todos, a respeito de todos, os que estavam na casa de seus pais, no domingo, foram muitos. Todos estavam muito à vontade, houve uma grande empatia entre as pessoas. Você me contou que seu pai gostou muito de mim e de saber que eu era advogada e trabalhava com o melhor amigo dele. Nem imaginava ele, que eu não estava me sentindo confortável com tudo o que estava acontecendo no escritório, que estava só empurrando com a barriga, ganhando tempo para tomar uma decisão que iria mudar o curso da minha vida.
Na quarta-feira, você quiz comemorar um contrato difícil que, com sua ajuda, havia sido assinado com sucesso. Iríamos jantar no restaurante que você me levou na primeira vez que saimos juntos. Senti que não era, apenas, uma comemoração por causa do contrato, havia algo mais, que você estava escondendo. O fato de escolher o local onde fomos pela primeira vez já queria dizer alguma coisa.
Como era cedo para irmos para o restaurante, saimos do edifício e fomos até um shopping, comprar um presente para sua irmã, que iria fazer aniversário no dia seguinte. Você me pediu para ajudá-lo a escolher algo especial. Não era tarde, mas já tinha escurecido. Nem chegamos a escolher o presente da Denise, seu telefone tocou. Seu rosto transformou-se, a notícia não era boa.
- Como ela está? Esse desgraçado chegou a fazer alguma coisa? Foi preso? Se ele fez alguma coisa, eu vou arrebentá-lo. Onde estão? Estou indo.
- O quê aconteceu?
- Minha irmã, tentaram estuprá-la no estacionamento, na saída da academia. O namorado dela viu e impediu, desarmou o cara e o prendeu até a chegada da polícia. O nosso jantar vai ficar pra outro dia, querida. Vou deixar você em casa e vou pra delegacia.
- Vou com você pra delegacia.
- Não vou levar você pra uma delegacia.
- Você se esqueceu que sou advogada? Eu posso ser útil. Além do mais, não quero que você faça nenhuma besteira. Vi como ficou. E foram mexer com sua irmã, sei como ela é especial para você.
- Não se trata, apenas, do carinho que tenho por ela. Estupro é abominável. Eu não suporte esses delinquentes que querem pegar mulheres a força... Se acontecesse alguma coisa assim com você, eu mataria o infeliz!
Eu nunca tinha visto você assim. Por um minuto, calei-me e senti que era importante para você. Porém, não era o momento para isso.
- Não vai acontecer nada, meu amor. Vamos, eu vou com você. Me deixa ficar do seu lado, neste momento. E num ambiente tão masculino como uma delegacia, sua irmã pode estar se sentindo constrangida. Se eu for com você, ela não se sentirá tão...
- Tá bom, você venceu.
Quando chegamos no distrito policial, o flagrante já estava sendo registrado, as partes sendo ouvidas, separadamente, pelo delegado e pelo escrivão. Denise estava com seu top de ginástica rasgado no ombro e um leve arranhão se desenhava em seu braço. O tarado tentou arrancar sua roupa, mas num movimento brusco, ela deu um puxão em seu braço e desvencilhou-se. Denise estava com a cabeça apoiada nos ombros largos de Alex, o namorado. Algumas lágrimas persistiam em escorrer de seus olhos. Quando nos viu, baixou os olhos, envergonhada, como se a culpa pelo quê aconteceu fosse dela. Você abraçou-a, carinhosamente:
- Minha menininha, você está bem? Esse infeliz machucou você?
- Não, Guto. Tá tudo bem comigo. Estou assustada com tudo o quê aconteceu. Se não fosse o Alex...não quero nem pensar...
- Gustavo, eu não avisei nada pro seus pais, ainda. Sei que Dona Isabel ficaria muito abalada e quiz preservá-la, por isso liguei pra você.
- Fez bem, Alex. A gente conta quando chegar em casa. E onde está o bandido?
- O delegado está tomando o depoimento dele. Vou avisar você que eu bati um pouquinho nele; estou até com receio que me enquadrem numa agressão.
- Não acredito que façam isso, Alex. Você estava defedendo uma pessoa, que é a sua namorada. E prendeu o indivíduo. Um bandido a menos nas ruas. Eu argumento a seu favor, se surgir essa possibilidade.
- Obrigado, Mila.
Instantes depois, o delegado saiu de sua sala. Logo atrás, dois policiais conduziam um indivíduo magro, cabelo bem curto, algemado. Os olhos estavam quase fechados, inchados, viam-se hematomas por todo o rosto, um corte no lábio inferior, andava com dificuldade. Eu fiquei impressionada com o estado do bandido, ele tinha apanhado bastante. Quando Alex falou que bateu "um pouquinho", não dava para imaginar a situação que tinha ficado o cara. Depois, soubemos que ele, também, havia levado uns sopapos e "cola-brincos" dos policiais.
Alex era um rapaz de estatura mediana, musculoso, praticava artes marciais, cabelos curtos e claros, olhos verdes. Quem o via, a primeira vista, o confundia com um "pittboy". Na realidade, era um rapaz da paz, do bem, não gostava de confusão. Era dono da academia onde Denise trabalhava como orientadora nutricional e, também, praticava seus exercícios.
Depois de lavrado o flagrante, instaurado o inquérito, tomadas todas as medidas de praxe, o que levou horas, fomos todos para casa de seus pais. Seu Otávio ouviu tudo sem pronunciar-se. Já Dona Isabel caiu em prantos diante do que poderia ter acontecido com a filha. Acalmamos a todos, pois a situação já estava resolvida e tudo sob controle. Quando estávamos saindo, Denise me chamou:
- Mila, eu queria agradecer você pela força.
- Você não tem de agradecer. Você passou por uma situção difícil, vai demorar um pouquinho para você superar, mas vai passar. Felizmente, nada de grave aconteceu. Você tem sorte de ter um namorado como Alex. Ele adora você e defenderia você até de uma quadrilha de terroristas.
- Tenho certeza que o Gustavo faria o mesmo por você. Ele teve sorte em ter conhecido você.
- Vou aceitar isso como um elogio, Dê.
- O Guto, como meu irmão mais velho, sempre foi um "paizão" pra mim, sempre me defendeu, sempre me protegeu. Ele é meu ídolo. Minha mãe conta que, quando eu era bebê, ele gostava de tomar conta de mim. Mila, cuida bem dele pra mim!
- Se depender de mim, Denise...
- O quê minhas garotas estão cochichando?
- Coisas de mulher, maninho.
- Vamos, Mila. Vou levá-la pra casa, seus pais devem estar preocupados.
- Sim, senhor. Estou as suas ordens.
- Engraçadinha!
- Eu sei, não sou ave-maria, mas sou cheia de graça.
- Tchau, Dê. Vou levar logo esta chata pra casa. Amanhã, venho ver você.
- Tchau, Dê. Daqui a pouco, seu irmão estará me puxando pelo cabelo...
- Tá me chamando de homem das cavernas?
- É você quem está dizendo.
- Vocês não tem jeito, hein? Guto e Mila, vocês estão se merecendo.
As brincadeiras eram uma forma de descontrair um pouco. Sua irmã ficou muito abalada, claro, quem não ficaria? Ainda bem que nada aconteceu. Você me levou pra casa. Ficou em silêncio durante todo o percurso. Não ousei falar nada, sabia que, o quê havia acontecido com a Denise, havia deixado você muito perturbado. Quando parou o carro em frente de casa, você respirou fundo e reencostou-se no banco. Aproximei-me de você e dei-lhe um beijo no rosto.
- Vai descansar um pouco. Já está tudo bem, procure relaxar...
Você não me deixou terminar, me tomou em seus braços e me beijou. Um beijo diferente, intenso e terno ao mesmo tempo, com carinho, apaixonado. Retribuí, entregando-me a seus lábios. Ficaria assim pelo resto da noite.
- Você não existe, Mila!
- Claro que existo. Quem você acabou de beijar? Um fantasma?
- Você entendeu o quê quiz dizer. Você é muito especial para mim. Precisamos conversar mais sobre nós, você sabe disso.
Assenti com a cabeça. Parece que estávamos na mesma sintonia. Estreitar nosso laço, firmar nossa relação, selar nosso amor. Já não era sem tempo. Pela primeira vez, senti o quão sério você considerava o nosso relacionamento. Pela primeira vez, você demonstrava o quanto gostava de mim. Senti-me especial e muito feliz em estar amando você e sendo amada. Abracei você, acariciei seus cabelos e ofereci meus lábios para um novo beijo. O mundo poderia parar naquele momento. Queria ficar com você, contudo a realidade nos chamava, dizendo que no dia seguinte tínhamos de trabalhar. Sabia que não conseguiria dormir. Um turbilhão de fatos, sentimentos e sensações não me deixaria cair no sono...
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